«Caleb left the office [Jeff's office, his pastor]. After he walked out through the church's front doors, he stopped under the archway and rubbed his temples. He was surprised to find himself shaking. Am I crazy? Jeff was his mentor and friend, and he had relied on his support and encouragement over the past couple of years. It had sustained him. But... he doesn't understand me anymore. It wasn't safe for him to bring up questions. Emptiness echoed in him like a late-night leaky faucet. His chest tightened. His eyes stung. He bowed his head and shuffled slowly through the drizzle to his parked car.»
A foto foi encontrada no grupo do facebook que referi num texto anterior: "I'm a christian and I'm proud." (Parece que há quem se esteja a divertir usando o grupo para fazer propaganda anti-cristã e esta foto serve muito bem esse propósito). O texto é um excerto de um livro que estou a ler, chamado True Story: A Christianity Worth Believing in. Em linhas gerais o livro é uma história inventada sobre um jovem cristão, chamado Caleb, que começa a questionar alguns aspectos da fé. Põe em causa o cerne do cristianismo que lhe ensinaram e mesmo o objectivo do evangelho. O bacano sente que na sua igreja é incompreendido e que não há abertura para colocar as questões que lhe assaltam a mente. Acaba por entrar em contacto com uma pessoa que o conduz num processo de redescoberta da fé. Uma fé com raízes mais sólidas, um evangelho que aponta para uma nova visão do mundo e para uma missão global que torna o cristianismo relevante no caos em que vivemos.
Encontro nesta história vestígios da minha própria biografia. Também tenho passado por um processo de redescoberta da fé. Cresci com dificuldade em me identificar com uma grande parte dos cristãos adultos que conhecia. Sempre me pareceu que em muito do que nós fazíamos na igreja não batia a bota com a perdigota. Sentia dificuldade em carregar a bagagem adicional à fé, composta por regras, costumes estranhos, tradições sem sentido e doutrinas confusas. Passei por muitos conflitos mentais e por uma fase de muita saturação. Felizmente ao longo do tempo conheci pessoas, tive conversas, vivi experiências e li livros que foram pavimentando o caminho da redescoberta da fé que eu mais tarde percorri. Hoje estou convicto que muita da bagagem adicional que me obrigavam a carregar é desnecessária e, até, prejudicial. Aos poucos, às vezes sorrateiramente, outras vezes com uma ponta de rebeldia que considero saudável, vou mandando essa bagagem às malvas!
É provável que muita gente da minha geração se identifique com a história do Caleb. Não fomos educados para a reflexão e sentimos que não há tempo e espaço para expor dúvidas e levantar questões. Diria até que muitos de nós fomos educados para ter medo das nossas próprias ideias... e por preguiça cedemos a esse medo! É mais fácil ir com a corrente! (E esta análise tanto é válida para cristãos como para não cristãos, basta substituir o contexto da igreja pelo da sociedade e da cultura!)
É mais fácil fazer o que sempre fizemos, pensar o que sempre pensámos, viver como sempre vivemos. É cómodo. Contudo a culpa não é só nossa. É uma questão de educação, de cultura e talvez também de conflito de gerações. Por ignorância, cobardia ou por razões ainda mais obscuras, não somos encorajados a pensar. Pelo contrário. Somos encorajados a tomar por empréstimo as ideias dos outros, a fé dos outros, os argumentos dos outros. Nos casos extremos, somos cobaias de uma lavagem cerebral efectuada por aqueles que têm poder sobre nós.
Infelizmente, às vezes a lavagem cerebral é feita através dos púlpitos. Criam-se rebanhos de ovelhas fanáticas que dizem "amééééé" a tudo. É o que eu chamo de "cristianismo" (obviamente entre aspas) castrador de identidades. E quando uma ovelha tem dúvidas é assaltada por um desconforto tão grande que mais vale reprimir todas as questões e lidar com os dilemas individualmente... até atingir o ponto de saturação. A foto lá de cima exemplifica o tipo de fundamentalismo promovido pelas igrejas mais extremistas. (Convém dizer que não conheço nenhuma igreja assim. Uma (pequena?) parte das igrejas evangélicas que conheço poderá ainda ter vestígios deste género de fundamentalismo, mas nada tão declarado como esta triste foto sugere.)
Reparem agora no contraste entre a foto lá de cima e a exortação que Paulo deu aos cristãos de Roma (exortação essa que, por estes dias, é um dos meus versículos preferidos): "Não se conformem com os padrões e costumes deste mundo, mas sejam como gente diferente, através da renovação da vossa maneira de pensar" Romanos 12:2
Pensar não tem nada de anti-cristão. Pelo contrário. O cristianismo deve estar na vanguarda do pensamento livre. Livre dos raciocínios viciosos que nos querem impingir, venham eles dos pulpitos, das tv's, dos professores, dos livros supostamente eruditos, etc. Livre das argumentações esfarrapadas que vigoram na sociedade, livre dos preconceitos que nos querem controlar... É esta a exortação de Paulo: não se conformem com a forma como as pessoas à vossa volta pensam a vida! Sejam diferentes! Pensem diferente! As igrejas devem promover tempo e espaço para as pessoas reflectirem, colocarem questões, porem em causa os pressupostos da vida e da fé. Construir passo a passo a fé (ou reconstruir) é um processo frutífero e que faz todo o sentido no mundo confuso em que vivemos. Acredito que, quando esse processo é motivado pelo desejo sincero de conhecer a verdade, é o próprio Deus que conduz as pessoas às respostas que elas precisam.
Para os meus amigos que não são cristãos, a minha mensagem é esta: ser cristão não é sinónimo de ser fanático e aceitar sem questionar tudo aquilo que nos querem enfiar no cérebro. No cristianismo há espaço para a dúvida e para as perguntas. Há espaço para pessoas que não sabem tudo e que discordam daquilo que outros cristãos dizem. Porque, ao contrário do que diz o cartaz da foto, ao contrário do estereótipo através do qual os cristãos são julgados, um cristão pode e deve ser "um free thinker".